
Um dia chuvoso de céu enegrecido. Os raios de sol só transpõem as negras nuvens o suficiente para saber-se que é dia. Um tempo frio. Poderia ser o cenário de um daqueles filmes dramáticos, de uma imagem descolorida, acinzentada. Sim, imaginemos assim. Mas esse cenário acinzentado como a visão de um mundo decaído, um mundo perverso, a nossa visão. E o céu enegrecido, aquilo que carregamos dentro de nós, a nossa natureza, que, embora, perversa, deixa passar uma leve claridade que dá indícios de quem éramos, de quem deveríamos ser, e faz-nos almejar traspassar este negro e denso céu de nossa decadência e encontrar a luz.
Eis o homem em decadência, alguém que pelo encantamento do supérfluo e proibido, desviou seus olhares do infinitamente valoroso, o inestimável tesouro que mentes decadentes tentam diminuir a glória e assassinar. Alguém que, agora, é vazio em essência e sentido, guardando ainda traços do que era, mas degenerando-se ainda mais a cada dia. Buscando o sentido que perdeu, buscando solucionar os paradoxos de sua existência. Perverso, em antítese, busca bondade. Busca nas coisas e em pessoas o tesouro que perdeu. Perdeu o rumo, como em uma noite de pura escuridão, tateia procurando algo que perdeu – talvez, pela própria escuridão, não saiba realmente aquilo que perdeu.
“Que quimera, então, é o homem! Que caos, que contradição, que prodígio! Juiz de todas as coisas, verme imbecil da terra; depositário da verdade; um poço de incertezas e horror, orgulho e refugo do universo.” (Blaise Pascal)
Cheios de questionamentos, desesperados por respostas; maus, mas fazendo-se e se dizendo bons; mentirosos, porém buscando sinceridade; complicados, mas buscando simplicidade; negando toda a verdade, porém ansiando por uma. Negando nossa natureza, negando quem deveríamos ser, negando Aquele tesouro incalculável, porém buscando pequenas porções de ferro, degradante e corrosível, com que possa se fartar.
“Nós somos os homens ocos / [...] / O elmo cheio de nada. Ai de nós!” (T. S. Eliot)
Homens vazios, com elmos, capacetes, nas cabeças, mas decapitados. Homens de corações e mentes vazias, tateando, como cegos, procurando o significado perdido de suas existências.
Buscamos traspassar as nuvens negras daquele céu por nossos próprios meios, além do cinza, almejamos a redenção, mas queremos auto-redenção. Este céu enegrecido de nossa natureza pecaminosa, degenerada, não deixará se converterá em luz a menos que o vento sopre, carregue as densas trevas e revele-nos uma maravilhosa luz.
“Falou-lhes, pois, Jesus outra vez, dizendo: Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida.”
(João 8.12)